Até quando tanto modernismo, meu Deus?

Verão. Férias de Janeiro do ano de 2011. Minha família e eu, em nossa viagem, passamos uns dias na bela cidade praiana de Guaratuba-PR. Como é uma região litorânea, a sua colonização começou cedo. A “antiga” igreja Matriz Nossa Senhora do Bom Sucesso teve sua construção iniciada no ano de 1768.

Hoje, quase 250 anos depois, ela está tombada como Patrimônio Artístico Nacional, recebendo muitos visitantes o ano todo. Atrás da “antiga” igreja Matriz, na mesma quadra, foi construída outra, totalmente diferente de sua antecessora.

Resolvemos ir à missa de Domingo na igreja “nova”, afinal, gostaríamos de conhecer o maior número de lugares possível durante nossa estadia fora. Logo na entrada, levei um susto: olhei para cima e vi várias luminárias, enfileiradas, em um teto rebaixado, na forma côncava. Um teto mais cool que o de muitas baladas por aí (Figura 1).

Figura 1: Destaque do teto da igreja.

Segui minha família e, caminhando pelo corredor, escolhemos um dos bancos do lado esquerdo do corredor central. Escutei um barulhinho. Olhei para cima, e ele vinha dos ventiladores. Lá, tinha um agradável sistema de ventiladores de umidade, aqueles que fazem com que gotículas de água atinjam uma maior parte do ambiente, tornando o ar mais fresco e úmido.

Neste ponto da trajetória, confesso que errei. Tinha abruptamente desviado minha atenção do motivo pelo qual eu estava ali, para prestar atenção nas luzes do teto rebaixado e no sistema de ventilação/aclimatação. Recompus-me. Afinal, eu estava ali para uma missa.

Olhei para o altar. Ele estava lá, no lugar central. “Que bom”, pensei. “As coisas novas pararam por aí.” Então, ergui o olhar um pouco, para enxergar o sacrário, e... Espera! Onde estava o sacrário? Será que a igreja estava em reforma? Não, pois a pintura das paredes estava em excelente condição, o imenso vitral com um cordeiro em mosaico também... Não tinha iluminação queimada, os ventiladores com umidade estavam todos trabalhando... Onde estava o sacrário, então?

Notei que um senhor fez reverência para o lado esquerdo do altar. Prestei mais atenção e... BINGO! Encontrei o sacrário. De todos os que eu já tinha visto, este era diferente. Ele estava à esquerda, muito longe do altar!

Contrastando com toda a pompa e modernidade da igreja, observei aquele sacrário de madeira, coberto com um tecido verde, à esquerda do altar, lá no cantinho (figura 2)... E pensar que, por séculos, altar e sacrário ficavam no mesmo lugar, inseparáveis, chamando toda atenção para si! Lugar do sacrifício, lugar do Deus transubstanciado. Enfim, no século passado, separaram o sacrário do altar. Agora, início do século XXI, afastaram-no ainda mais, deixando-o à esquerda, lá no cantinho...

Figura 2: Sacrário de madeira, coberto por tecido verde, no canto à esquerda da foto.

Diz a instrução Redemptionis Sacramentum:

CAPÍTULO VI
1. A conservação da Santíssima Eucaristia
[130] «De acordo com a estrutura de cada igreja e os legítimos costumes de cada lugar, o Santíssimo Sacramento será guardado em um sacrário, na parte mais nobre da igreja, mais insigne, mais destacada, mais convenientemente adornada e também», pela tranquilidade do lugar, «apropriado para a oração», com espaço diante do sacrário, assim com suficientes bancos ou assentos e genuflexórios. Atenda-se diligentemente, além disso, a todas as prescrições dos livros litúrgicos e às normas do direito, especialmente para evitar o perigo de profanação. (FONTE)

Mas... Se o sacrário estava lá no cantinho, tinha alguma coisa no lugar onde ele “deveria” estar?

Olhei para trás do altar e a resposta foi: SIM, tinha!

O que era?

Era um imenso ventilador, que ficava ligado o tempo todo, nas costas do padre! Claro né, cidade litorânea, muito sol, calor... O ventilador em funcionamento pode ser visto na figura 3, atrás do altar.

Figura 3: Ventilador atrás do altar. Onde foi parar o sacrário, mesmo?

Antes de iniciar a missa, uma música de acolhida. Bem animada, e com muitas palmas, no ritmo da música:

 Só estava faltando você aqui / bem-vindo à celebração...♫

“Bem forte!” - pedia a cantora.

Nesse ponto eu já não me assustava mais. O que acontecesse, daí pra frente, não me surpreenderia.

Mas surpreendeu.

Uma das músicas de acompanhamento - se não me engano, a do ofertório – foi em ritmo de forró.

Forró numa missa?

É, forró numa missa.

Onde?

Em Guaratuba-PR, Janeiro de 2011.

O que é sacro e o que é secular? Ainda existe essa distinção? Será?

Pra Verdadeira Igreja Católica Apostólica Romana, existe, e sempre existirá. Meu medo é que, na ânsia por adaptar a “Igreja” ao “Homem”, acabemos desfigurando toda a beleza da tradição e ortodoxia católica.

Antes da bênção final, nos avisos, o padre nos disse para ficarmos tranquilos com o calor excessivo, pois logo logo seria instalado um agradável sistema de ar-condicionado no interior da igreja.

Sacrário? Este fica à esquerda, lá no cantinho. E de madeira!

Bênção final dada. Após o forró no meio da missa, na despedida foi a vez de outro ritmo bem popular: o samba. Isto mesmo! SAMBA. A canção na saída da missa foi marcada por um “adorável” samba.

Não voltei mais lá, nem tive notícias, mas há grandes chances do sistema de ar-condicionado já ter sido instalado, e estar refrescando todos os fiéis. Talvez o padre tenha até “aposentado” o ventilador de trás do altar. Enquanto isso, o sacrário de madeira continua à esquerda, no cantinho...

Por fim, mostro duas fotos muito parecidas. A primeira (Figura 4a), é da igreja onde assisti à essa missa. A segunda (Figura 4b) é da igreja da denominada “Igreja Adventista do Sétimo Dia”, em Curitiba-PR. Alguma semelhança???

(a)(b)

Figura 4: (a) Igreja católica, em Guaratuba-PR; (b) igreja protestante adventista do sétimo dia, em Curitiba-PR.